segunda-feira, 24 de setembro de 2012



        Quem não Ama a Solidão, não Ama a Liberdade

  Nenhum caminho é mais errado para a felicidade do que a vida no grande mundo, às fartas e em festanças (high Life), pois, quando tentamos transformar a nossa miserável existência numa sucessão de alegrias, gozos e prazeres não conseguiram evitar a desilusão; muito menos o seu acompanhamento obrigatório, que são as mentiras recíprocas.
  Assim como o nosso corpo está envolto em vestes, o nosso espírito está revestido de mentiras. Os nossos dizeres, as nossas ações, todo o nosso ser é mentiroso, e só por meio desse invólucro pode-se, por vezes, adivinhar a nossa verdadeira mentalidade, assim como pelas vestes se adivinha a figura do corpo.

  Antes de tudo, toda a sociedade exige necessariamente uma acomodação mútua e uma temperatura; por conseguinte, quanto mais numerosa, tanto mais enfadonha será. Cada um só pode ser ele mesmo, inteiramente, apenas pelo tempo em que estiver sozinho. Quem, portanto, não ama a solidão, também não ama a liberdade: apenas quando se está só é que se está livre.
  A coerção é a companheira inseparável de toda a sociedade, que ainda exige sacrifícios tão mais difíceis quanto mais significativos for à própria individualidade. Dessa forma, cada um fugirá, suportará ou amará a solidão na proporção exata do valor da sua personalidade. Pois, na solidão, o indivíduo mesquinho sente toda a sua mesquinhez, o grande espírito, toda a sua grandeza; numa palavra: cada um sente o que é.

  Ademais, quanto mais elevada for a posição de uma pessoa na escala hierárquica da natureza, tanto mais solitária será, essencial e inevitavelmente. Assim, é um benefício para ela se à solidão física corresponder a intelectual. Caso contrário, a vizinhança frequente de seres heterogéneos causa um efeito incómodo e até mesmo adverso sobre ela, ao roubar-lhe seu «eu» sem nada lhe oferecer em troca. Além disso, enquanto a natureza estabeleceu entre os homens a mais ampla diversidade nos domínios moral e intelectual, a sociedade, não tomando conhecimento disso, iguala todos os seres ou, antes, colocam no lugar da diversidade as diferenças e degraus artificiais de classe e posição, com frequência diametralmente opostos à escala hierárquica da natureza.
Nesse arranjo, aqueles que a natureza situou em baixo encontram-se em óptima situação; os poucos, entretanto, que ela colocou em cima, saem em desvantagem. Como consequência, estes costumam esquivar-se da sociedade, na qual, ao tornar-se numerosa, a vulgaridade domina.

Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'

domingo, 23 de setembro de 2012




Para refletir sobre a existência


  Olhem de novo para esse ponto. Isso é a nossa casa, isso somos nós. Nele, todos a quem ama, todos a quem conhece, qualquer um dos que escutamos falar, cada ser humano que existiu viveu a sua vida aqui. O agregado da nossa alegria e nosso sofrimento, milhares de religiões autênticas, ideologias e doutrinas econômicas, cada caçador e fazendeiro, cada herói e covarde, cada criador e destruidor de civilização, cada rei e camponês, cada casal de namorados, cada mãe e pai, criança cheia de esperança, inventor e explorador, cada mestre de ética, cada político corrupto, cada superestrela, cada líder supremo, cada santo e pecador na história da nossa espécie viveu aí, num grão de pó suspenso num raio de sol.

  A Terra é um cenário muito pequeno numa vasta arena cósmica. Pensai nos rios de sangue derramados por todos aqueles generais e imperadores, para que, na sua glória e triunfo, vieram eles ser amos momentâneos duma fração desse ponto. Pensai nas crueldades sem fim infligidas pelos moradores dum canto deste pixel aos quase indistinguíveis moradores dalgum outro canto, quão frequentes as suas incompreensões, quão ávidos de se matar uns aos outros, quão veementes os seus ódios.

 As nossas exageradas atitudes, a nossa suposta auto importância, a ilusão de termos qualquer posição de privilégio no Universo, são reptadas por este pontinho de luz frouxa. O nosso planeta é um grão solitário na grande e envolvente escuridão cósmica. Na nossa obscuridade, em toda esta vastidão, não há indícios de que vá chegar ajuda de algures para nos salvar de nós próprios.

  A Terra é o único mundo conhecido, até hoje, que alberga a vida. Não há mais algum, pelo menos no próximo futuro, onde a nossa espécie puder emigrar. Visitar pôde. Assentar-se, ainda não. Gostarmos ou não, por enquanto, a Terra é onde temos de ficar.

  Tem-se falado da astronomia como uma experiência criadora de firmeza e humildade. Não há, talvez, melhor demonstração das tolas e vãs soberbas humanas do que esta distante imagem do nosso miúdo mundo. Para mim, acentua a nossa responsabilidade para nos portar mais amavelmente uns para com os outros, e para protegermos e acarinharmos o ponto azul pálido, o único lar que tenhamos conhecido.

                                                                        Carl Sagan.



Viver de Olhos Fechados

  É propriamente ter os olhos fechados, sem jamais tentar abri-los, viver sem filosofar; e o prazer de ver todas as coisas que a nossa visão descobre não é comparável à satisfação proporcionada pelo conhecimento daquelas que encontramos por meio da filosofia; e, finalmente, esse estudo é mais necessário para regrar os nossos costumes e conduzir-nos por essa vida do que o uso dos nossos olhos para orientar os nossos passos.
(...) Se desejamos seriamente ocupar-nos com o estudo da filosofia e com a busca de todas as verdades que somos capazes de conhecer, tratemos, em primeiro lugar, de nos libertar dos nossos preconceitos, e estaremos em condições de rejeitar todas as opiniões que outrora recebemos através da nossa crença até que as tenhamos examinado novamente; em seguida, passaremos em revista as noções que estão em nós, e só aceitaremos como verdadeiras as que se apresentarem clara e distintamente ao nosso entendimento.

                                                                      ‘René Descartes, in 'Princípios da Filosofia’






Tempo e Idade

  A jovialidade e a coragem da vida, características da juventude, devem-se em parte ao facto de estarmos a subir a colina, sem ver a morte situada no sopé do outro lado. Porém, ao transpormos o cume, avistamos de facto a morte, até então conhecida só de ouvir dizer. Ora, como ao mesmo tempo a força vital começa a diminuir, a coragem também decresce, de modo que, nesse momento, uma seriedade sombria reprime a audácia juvenil e estampa-se no nosso rosto. Enquanto somos jovens, digam o que quiserem, consideramos a vida como sem fim e usamos o nosso tempo com prodigalidade. Contudo, quanto mais velhos ficamos, mais o economizamos. Na velhice, cada dia vivido desperta uma sensação semelhante à do delinquente ao dirigir-se ao julgamento.
Do ponto de vista da juventude, a vida é um futuro infinitamente longo; do da velhice, é um passado bastante breve. Desse modo, o começo apresentasse-nos como as coisas ao serem vistas pela lente objetiva do binóculo de opera; o fim, entretanto, como se vistas pela ocular. É preciso ter envelhecido, portanto ter vivido muito, para reconhecer como a vida é breve. O próprio tempo, na juventude, dá passos bem mais lentos. Por conseguinte, o primeiro quartel da vida é não só o mais feliz, mas também o mais longo, e deixa muito mais lembranças, sendo que cada um poderia contar muito mais coisas sobre ele do que sobre o segundo quartel. Como na primavera do ano, também na da vida os dias acabam por tornarem-se incomodamente longos. No outono de ambos, tornam-se mais breves, porém mais serenos e constantes.

            ‘Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida’

                        
                                        A alienação presente em nossos dias

  Ao falarmos em Alienação alguns destacam como principal aliado desse processo o Capitalismo. Entretanto se uma abordagem mais profunda for realizada, é possível perceber que há uma complexidade maior nesse tema. Para isso algumas áreas em que a alienação atua de qualquer forma serão destacadas, e analisadas.
  Na sociedade atual, ao procurar onde se inicia a alienação, é possível destacar o que acontece dentro das organizações. O dono do meio de produção tenta arrancar o conhecimento sobre o processo produtivo, de uma forma que só reste uma fração desse processo, sobre o domínio do trabalhador. O objetivo disso tudo, é para evitar que nesse trabalhador, um sentimento de posse sobre o produto, surja.
  Ao analisarmos o processo pelo qual o colaborador passa, dentro das organizações, é possível perceber que a Gestão criou técnicas muito eficientes de mapear quanto o trabalhador sabe sobre o processo produtivo, e também alternativo para limitar essa capacidade. Quando falamos em uma análise dos cargos, nada mais é do que o mapeamento do conhecimento, e a divisão sistêmica do processo produtivo, servem como agente limitador. Sem falar no processo repetitivo, pelo qual o trabalhador passa. Aí, basicamente, está o início da Alienação.
  Em fases mais avançadas, o individuo começa a sentir a necessidade da estrutura organizacional, na vida social, a partir daí é que podemos dizer que ele não consegue mais identificar a sua verdadeira essência, ou seja, esse tipo de comportamento cria uma falsa sensação de que o colaborador é o cargo, literalmente. Ele precisa de todo um sistema, utilizado na empresa, para gerir as relações cotidianas, no meio social.
  Para os que duvidam que exista uma alienação tão doentia, e afirmam que caso isso ocorresse, o trabalhador estaria blindado, pois, "o estado tentaria defender os direitos do cidadão". Eu pergunto: será que para os responsáveis pelo estado, não é melhor que a fração da população, que trabalha, esteja completamente incapaz de refletir sobre o governo? Totalmente influenciável, por necessitar da estrutura manipulativa? É possível conseguir argumentos para responder a esses questionamentos, fazendo uma observação da sociedade brasileira. Quando algum escândalo político aparece, como mesalão, CPI's, etc... Os veículos de comunicação em massa, logo passam a divulgar notícias sobre futebol, moda, assuntos que mudam o foco da população. Logo, eles estão suprindo a necessidade de manipulação da sociedade.
  Outro exemplo da decorrência manipulativa na sociedade é a questão das Religiões. Para alguns é fácil perceber, como a manipulção dessas igrejas está presente. Recentemente, os fundadores, de uma Igreja, tiveram os seus bens confiscados pela justiça, por terem sido adquiridos com fundos não comprováveis. Esses fundos são oriundos de doações feitas pelos fiéis, que são manipulados, por terem suas capacidades comprometidas, já que sua identidade foi perdida.
  Há também um forte estímulo a alienação, quando a "devastação" cultural ocorre. A cultura de um povo passa ser sua identidade. Quando uma nova cultura tenta ser imposta, sobre a cultura original, através de um enfoque apelativo muito grande, nós temos outra forma de alienação. Quem nunca ouviu falar do "American way of life"? Ali está uma tentativa de imposição cultual, com a finalidade de introduzir um forte consumismo nas sociedades.
  Fugindo um pouco das alternativas capitalistas, e fazendo uma abordagem com o foco no Comunismo. O comunismo é um modelo político-econômico, baseado nos ideais socialistas. Nesse sistema, nós temos a produção coletivista, e um modelo social onde, teoricamente, seria igualitário.
  Para esse regime, há a perspectiva de que todos os seres humanos são iguais na sociedade. O trabalho é comum, e todos os funcionários, detêm alguma responsabilidade sobre o processo produtivo. Quando focamos na questão do trabalho no comunismo, nós percebemos que o trabalhador também só detém uma fração do conhecimento necessário, tudo bem que o trabalhador está produzindo para a sociedade. Mas ele continua sem deter o conhecimento necessário para a produção completa.
  No sistema comunista, nós temos o governo controlando tudo o que será passada a população, desde as técnicas produtivas, até as notícias. Então percebemos que há alguém no comando, que necessita da mesma alienação "capitalista", no regime comunista.
  A questão principal é que, independente do modelo político-econômico, a Alienação estará presente. No capitalismo, ela se faz necessária, para o controle organizacional e social, e consequentemente, conseguir a mais-valia. No regime Comunista, nós também temos a necessidade de alienação, com o propósito do controle social, afim da manutenção do poder, e até do próprio regime. Independente disso, a alienação é um problema que está intrínseco ao ser humano, pois, sempre que existir a necessidade de dominação de um ser sobre o outro, existirá a alienação.

O Centro do Universo

  Se todo o indivíduo pudesse escolher entre o seu próprio aniquilamento e o do resto do mundo, não preciso dizer para que lado, na maioria dos casos, penderia a balança. 
  Conforme essa escolha, cada um faz de si o centro do universo, refere tudo a si mesmo e considera primeiramente tudo o que acontece - por exemplo, as maiores mudanças no destino dos povos - do ponto de vista do seu interesse. Ainda que este seja muito pequeno e remoto, é nele que pensa acima de tudo. Não existe contraste maior do que aquele entre a alta e exclusiva divisão, que cada um faz dentro do seu próprio eu, e a indiferença com a qual, em geral, todos os outros consideram aquele eu, bem como o primeiro faz com o deles.
  Chega a ter o seu lado cómico ver os inúmeros indivíduos que, pelo menos no aspecto prático, consideram-se exclusivamente reais e aos outros, de certo modo, como meros fantasmas.
[...] O único universo que todos realmente conhecem e do qual têm consciência é aquele que carregam consigo como sua representação e que, portanto, constitui o seu centro. É justamente por isso que cada um é em si mesmo tudo em tudo.

                                          Arthur Schopenhauer, in "A Arte de Insultar"


Pensar com café: Só o Presente é Verdadeiro e Real  Um ponto impo...

Pensar com café:
Só o Presente é Verdadeiro e Real
  Um ponto impo...
: Só o Presente é Verdadeiro e Real   Um ponto importante da sabedoria de vida consiste na proporção correta com a qual dedicamos a nos...

O amor não acaba nós é que mudamos...

  Um homem e uma mulher vivem uma intensa relação de amor, e depois de alguns anos separam-se, cada um vai à busca do próprio caminho, saem do raio de visão um do outro. Que fim levou aquele sentimento? O amor realmente acaba? O que acaba é algumas de nossas expectativas e desejos, que são substituídos por outros no decorrer da vida.
  As pessoas não mudam na sua essência, mas mudam muito de sonhos, mudam de pontos de vista e de necessidades, principalmente de necessidades. O amor costuma ser amoldado à nossa carência de envolvimento afetivo, porém essa carência não é estática, ela se modifica à medida que vamos tendo novas experiências, à medida que vamos aprendendo com as dores, com os remorsos e com nossos erros todos. O amor mantém-se o mesmo apenas para aqueles que se mantêm os mesmos.
  Se nada muda dentro de si, o amor que se sente, ou que se sofre, também não muda. Amores eternos só existem para dois grupos de pessoas. O primeiro é formado por aqueles que se recusam a experimentar a vida, para aqueles que não querem investigar mais nada sobre si mesmo, que estão contentes com o que estabeleceram como verdade numa determinada época e seguem com esta verdade até os 120 anos.
  O outro grupo é o dos sortudos: aqueles que amam alguém, e mesmo tendo evoluído com o tempo, descobrem que o parceiro também evoluiu, e essa evolução deu-se com a mesma intensidade e seguiu na mesma direção. Sendo assim, conseguem renovar o amor, pois a renovação particular de cada um foi tão parecida que não gerou conflito entre eles. O amor não acaba. O amor apenas sai do centro das nossas atenções. O tempo desenvolve as nossas defesas, oferece-nos outras possibilidades e avançamos porque é da natureza humana avançar. Não é o sentimento que se esgota, somos nós que ficamos esgotados de sofrer, ou esgotados de esperar, ou esgotados da "mesmice".
A paixão termina amor não. Amor é aquilo que ocupa todos os nossos espaços, enquanto for bem-vindo, e que transferimos para o quarto dos fundos quando não funciona mais, mas que nunca expulsamos definitivamente de casa.

(Martha Medeiros)

Só o Presente é Verdadeiro e Real

  Um ponto importante da sabedoria de vida consiste na proporção correta com a qual dedicamos a nossa atenção em parte ao presente, em parte ao futuro, para que um não estrague o outro. Muitos vivem em demasia no presente: são os levianos; outros vivem em demasia no futuro: são os medrosos e os preocupados. É raro alguém manter com exatidão a justa medida. Aqueles que, por intermédio de esforços e esperanças, vivem apenas no futuro e olham sempre para a frente, indo impacientes ao encontro das coisas que hão-de vir, como se estas fossem portadoras da felicidade verdadeira, deixando entrementes de observar e desfrutar o presente, são, apesar dos seus ares petulantes, comparáveis àqueles asnos da Itália, cujos passos são apressados por um feixe de feno que, preso por um bastão, pende diante da sua cabeça. Desse modo, os asnos veem sempre o feixe de feno bem próximo, diante de si, e esperam sempre alcançá-lo.
  Tais indivíduos enganam-se a si mesmos em relação a toda a sua existência, na medida em que vivem ad interim[interinamente], até morrer. Portanto, em vez de estarmos sempre e exclusivamente ocupados com planos e cuidados para o futuro, ou de nos entregarmos à nostalgia do passado, nunca nos deveríamos esquecer de que só o presente é real e certo; o futuro, ao contrário, apresenta-se quase sempre diverso daquilo que pensávamos.
  O passado também era diferente, de modo que, no todos ambos têm menor importância do que parecem. Pois a distância, que diminui os objetos para o olho, engrandece-os para o pensamento. Só o presente é verdadeiro e real; ele é o tempo realmente preenchido e é nele que repousa exclusivamente a nossa existência. Dessa forma, deveríamos sempre dedicar-lhe uma acolhida jovial e fruir com consciência cada hora suportável e livre de contrariedades ou dores, ou seja, não a turvar com feições carrancudas acerca de esperanças malogradas no passado ou com ansiedades pelo futuro. Pois é inteiramente insensato repelir uma boa hora presente, ou estragá-la de propósito, por conta de desgostos do passado ou ansiedades em relação ao porvir.
                                                      
                                                            'Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'